Por Flávia Lima Moreira* 

Em Charqueadas, aproximadamente 20 crianças e adolescentes esperam ansiosos pela volta às aulas. Diferentemente da maioria dos estudantes gaúchos, porém, eles não estão desde março de 2020 longe das classes, mas desde 2018, quando um incêndio consumiu a escola da comunidade.

Estamos falando dos estudantes da aldeia Tekoá Guajayvi, localizada na Grande Porto Alegre. Quase dois anos após verem sua sala de aula ser destruída pelo fogo, esse alunos indígenas agora assistem ao governador gaúcho Eduardo Leite (PSDB) sugerir um calendário para a retomada das aulas no Rio Grande do Sul sem que a lacuna de um novo espaço escolar na comunidade tenha sido preenchida. O que essas crianças, suas famílias e o cacique da aldeia, Cláudio Acosta, esperam, e há muito mais tempo, é que a oferta de serviços públicos básicos chegue ao seu território.

Durante o ano de 2019, as crianças indígenas improvisaram locais para fazer de sala de aula. Em dias de chuva, porém, não podiam estudar. Já em fevereiro de 2020, quando o ano letivo teve início no Estado, Acosta não conseguiu iniciar as aulas na sua aldeia. Dois problemas o impediram: a falta de merenda escolar e de uma sala de aula. A reforma da escola ficou apenas em mais uma promessa engavetada desde 2018 e novamente em 2019. Os 20 alunos, com idades correspondentes a séries que vão do jardim da infância ao nono ano do Ensino Fundamental, esperam, desde 2018, por uma ação da 12ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) e da Secretaria Estadual de Educação.

A educação é um direito garantido constitucionalmente. Porém, o sentimento relatado pelos indígenas é de esquecimento dos seus direitos. Segundo eles, nacionalmente, povos tradicionais e originários vêm sofrendo uma onda severa de ataques e de retirada de direitos, e no Rio Grande do Sul, o descaso e o abandono se repetem.

Mina de carvão no local pode agravar a situação dos estudantes

A 350.org, ONG global que atua por uma transição energética para fontes renováveis e socialmente justas, acompanha de perto a situação na aldeia e denuncia que um novo fator pode agravar o desrespeito aos direitos das crianças e adolescentes da região: a concretização do projeto da Mina Guaíba. O empreendimento prevê a instalação da maior mina de carvão a céu aberto do Brasil em área próxima à aldeia, em plena Região Metropolitana de Porto Alegre.

Renan Andrade, organizador de campanhas da 350.og na América Latina, explica que a mina poluiria o ar da região e traria danos irreversíveis aos indígenas, além de riscos de contaminação das fontes de água e do solo. A desestabilização da comunidade e a degradação do território poderiam prejudicar ainda mais o acesso dos estudantes a uma educação de qualidade e a um ambiente adequado para se desenvolverem.

“Para ser instalada,  a mina teria que destruir a aldeia Tekoá Guajayvi e outras duas aldeias, em nome da produção de carvão, que é um verdadeiro lixão químico e social. Não permitiremos que mais aldeias sejam eliminadas e que as famílias que vivem nessas comunidades tenham sua existência e seus direitos ignorados. A luta por uma nova escola na região, assim como a luta pelo meio ambiente, são garantias de cidadania aos indígenas da Grande Porto Alegre”, disse.

Segundo Andrade, caso o poder público não cumpra seu papel, a comunidade e a 350.org deverão iniciar uma ação social para garantir um direito básico dos 20 estudantes afetados: acesso à educação.

  • Flávia Lima Moreira é jornalista e colabora com a 350.org

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