Debates sobre os impactos do fracking, os mega projetos de desenvolvimento e os desafios para o futuro envolveram mais de 50 entidades de todas as regiões do país

 

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Marcando seus sete anos de existência, o Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social (FMCJS) realizou em Brasília, entre os dias 25 e 28 de outubro, o Seminário Nacional sobre Mudanças Climáticas e Justiça Social. O objetivo principal foi debater as causas do aquecimento global e seus impactos sobre a vida das pessoas em todas as regiões do país. O encontro contou com a participação de representantes de mais de 50 entidades. Foram discutidas estratégias de ações frente aos desafios que as conjunturas político-econômicas nacional e global apresentam.

Temas como a ameaça do fracking no Brasil, os desastres socioambientais que atingem as comunidades mais vulneráveis, projetos de desenvolvimento que impactam populações tradicionais, decisões governamentais em todos os níveis e os compromissos mundiais de redução das emissões de gases do efeito estufa, previstos no Acordo de Paris, foram trazidos para as plenárias.

Ivo Poletto, assessor nacional do FMCJS, destacou que os líderes mundiais têm o dever de responder ao desafio global colocado pelas mudanças climáticas. “Alguma coisa precisa ser feita já. Quanto mais nos demoramos para agir, mais o mundo vai se aprofundando nessa crise. E a resposta efetiva ainda não veio.” Segundo ele, o Acordo de Paris foi positivo, pois deu-se um passo adiante, mas os compromissos ainda estão muito aquém do que deveria estar sendo feito.

“Foi um marco histórico em relação aos fracassos anteriores. Mesmo assim, todas as metas propostas são insuficientes e, na verdade, nem chegam a reduzir em 2oC o aquecimento global até o fim deste século. Se todos os países cumprirem suas metas teremos a temperatura terrestre entre 2,7o e 3oC no final de 2100. Só o grupo de países do G-20, os maiores poluidores, precisaria de metas 6x maiores. Ou seja, tem que haver uma mudança no padrão de consumo, uma mudança geral no modelo de desenvolvimento”, completou.

O fracking, ou a técnica de faturamento hidráulico não convencional para extração de gás de xisto, foi outro tema polêmico. Muito pouco conhecida da população, ela causou preocupação durante a apresentação de Reginaldo Urbano Argentino, coordenador da campanha de desinvestimento em combustíveis fósseis da 350.org Brasil, membro da COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida, e presidente da Cáritas Paraná.

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Durante sua fala, ele apresentou os dados sobre quantos blocos já foram ofertados no Brasil durante a 13a rodada da Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP), que aconteceu em outubro de 2015, e também as regiões já mapeadas para a atividade. “O governo federal vendeu uma mentira às empresas do setor, dizendo que aqui elas não encontrariam resistência. Mas foram totalmente desmascarados, quando mostramos que fazemos parte de um movimento nacional e global que não quer mais a dependência dos combustíveis fósseis”, frisou Reginaldo.

No Brasil, os números assustam: estão na mira da extração do gás de xisto nada menos do que 15 estados, 378 cidades e 38 milhões de brasileiros. Além disso, a técnica também traz ameaças às atividades agrícola e pecuária, uma vez que promove a contaminação do solo e das reservas de água subterrânea e de superfície. O fracking pode afetar 90% da produção somente no Paraná, 19% em São Paulo e 15% no Mato Grosso. Os riscos às populações tradicionais também são grandes, já que muitos dos blocos incidem sobre Unidades de Conservação e Terras Indígenas.

“O fracking é uma ameaça trazida pelo governo a partir de 2009. Se permitirmos que isso aconteça, infelizmente teremos um grave problema pela frente. Nos Estados Unidos, onde a prática já acontece, mais de um milhão de poços já foram explorados. São regiões onde não há mais cultivo, agricultura, onde poucas pessoas subsistem, onde a vida não é mais possível. Na Argentina também já há casos de pessoas contaminadas, em risco de morte, por conta do fracking.”

Diante de tantas ameaças e desafios, Nilmario Rocha Guerra, representante do Movimento dos Pequenos Agricultores do Espírito Santo e membro da coordenação do Coletivo Estadual da Juventude, demonstrou sua preocupação com o futuro. “Não bastasse o pré-sal, a lama da Samarco, os derramamentos de petróleo que já vivenciamos, o monstro de Belo Monte e todas as afrontas que sofremos todos os dias enquanto movimentos sociais, ainda fico sabendo que querem nos fazer engolir o fracking, esse ‘Frackingstein’. Eu, como jovem que ainda quero viver mais algumas décadas, fico realmente muito preocupado.”

Como forma de conforto, Reginaldo finalizou sua palestra reforçando que nem tudo está perdido. E que a força de cada cidadão e dos coletivos ainda pode evitar muitas dessas mazelas. “Nossa ação deve começar localmente. A maneira que encontramos para nos proteger contra o fracking, por exemplo, foi com a aprovação de leis municipais. Hoje já somamos 191 municípios, entre os que já tiveram áreas leiloadas e em fase próxima de leilão, livres dessa prática. Desses, 182 são do Paraná. O caminho é a mobilização e conscientização da população, e a apresentação de leis municipais e estaduais, até que consigamos mover uma lei federal, que obrigue o Estado a expulsar essas empresas do nosso território de uma vez por todas.”

Ele aproveitou o encerramento para convocar a todos a realizar uma vigília global pelos refugiados, pessoas e famílias impactadas pelas mudanças climáticas, que acontecerá nos dias 05 e 06 de maio de 2017.

Na carta final do encontro foram ressaltados a luta contra a exploração irresponsável dos recursos naturais do planeta por parte dos grandes capitalistas e suas consequências. Veja abaixo a introdução da carta.

Seminário Nacional do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social

PRECISAMOS REESCREVER O FUTURO

AGORA!

Viemos de todos os estados brasileiros, do Distrito Federal, das comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, da agricultura familiar, das cidades, dos movimentos sociais e populares do campo, das florestas, das águas e das cidades, todxs violentadxs por projetos extrativistas e de infraestrutura como hidrelétricas, termoelétricas, energia eólica e nuclear, transposição de rios, mineração, pecuária, extração de fontes fósseis (convencionais e não convencionais), expansão da monocultura e do agronegócio, agrotóxicos, projetos de créditos de carbono, desastres ambientais que geram migrações forçadas e projetos urbanos que expulsam comunidades. Em Brasília, no Seminário Nacional do Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social, de 25 a 28 de outubro de 2016, refletimos sobre as mudanças climáticas, socializamos os gritos, nos fortalecemos para enfrentar os mega-projetos patrocinados pelo sistema capitalista, por meio de corporações e governos que atentam contra a vida da Mãe Terra, de suas Filhas e Filhos.

Leia aqui a íntegra da carta.