Sharm El Sheikh, Egito – Nos últimos dias da conferência do clima da ONU, uma coalizão de organizações da sociedade civil adverte que a COP27 corre o risco de ser rotulada como um fracasso, caso o texto final não inclua compromissos de eliminação progressiva de todos os combustíveis fósseis.
Em coletiva de imprensa realizada na quarta-feira (16/11), especialistas cobraram das lideranças da COP27 que o texto final da conferência mencione a necessidade de uma eliminação progressiva, rápida, justa e equitativa dos combustíveis fósseis, a fim de limitar o aquecimento global médio em 1,5 °C.
May Boeve, 350.org
“Como costuma ocorrer nessas negociações, nos colocamos diante de cenários decisivos. Esta COP não é diferente. Mais uma vez, estamos numa encruzilhada em que as decisões das próximas 48 horas impactarão o mundo nos próximos anos. Hoje, é isso que pede a sociedade civil: devemos eliminar os combustíveis fósseis progressivamente. Esse é o nosso grito de guerra – em ações, coletivas de imprensa e eventos paralelos, hoje é o dia em que nós, o movimento da sociedade civil, responsabilizamos os governos e exigimos que uma eliminação progressiva, equitativa, gerenciada e justa de todos os combustíveis fósseis integre o texto final da COP27. Se alcançamos menos do que em Glasgow, a COP27 será vista como um fracasso pelo mundo.”
Harjeet Singh, CAN internacional
“Viemos aqui para exigir justiça climática, mas sabemos o que está acontecendo. Mais de 630 lobistas dos combustíveis fósseis transformaram esta COP numa feira e estão agravando a crise climática. A indústria dos combustíveis fósseis é diretamente responsável pela morte e destruição que estamos vendo ao redor do mundo e essa mesma indústria se beneficia com a crise, obtendo lucros obscenos. Neste momento, o texto final não menciona a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis, e eles precisam ser mencionados em sua totalidade. É hora de cobrar os países que não estão permitindo esses termos críticos sobre os combustíveis fósseis no texto final.”
Omar Elmawi, Stop EACOP, 350.org
“Estou aqui com uma mensagem clara e simples: é inaceitável inclusive considerar a possibilidade de grandes projetos como o Oleoduto da África Oriental (EACOP), quando são necessários cortes imediatos e profundos nas emissões para evitar impactos climáticos catastróficos. Não aceitamos que a necessidade de lidar com a crise energética possa ser usada para permitir projetos de combustíveis fósseis, incluindo desenvolvimentos arriscados relacionados ao gás. Essa mensagem precisa ser ouvida e posta em prática, e compromissos devem ser assumidos para interromper esses projetos. Os recursos devem ser canalizados, de modo que haja uma transição justa para a energia renovável, liderada pela comunidade. Precisamos de soluções verdadeiras e reais para o continente africano.”
Luisa Nebauer, Fridays for Future, Alemanha
“Esta COP se transformou em um teatro da energia gerada por combustíveis fósseis. Nem acredito que estou aqui, faltando dois dias para o fim dessas negociações climáticas, lutando pela inclusão dos combustíveis fósseis no texto final, quando sabemos que a crise climática está sendo causada por esses combustíveis. Só porque alguns líderes da indústria se magoam quando dizemos que a era dos combustíveis fósseis acabou, que o modelo deles não funciona. Esta COP deve ser aquela em que os combustíveis fósseis chegam ao fim”.
Jo Sikulu, Guerreiros Climáticos do Pacífico, 350.org
“A mensagem do Pacífico é muito clara. A extração contínua de combustíveis fósseis nos levará muito além do aquecimento de 1,5 °C, o que significa ciclones mais intensos, um volume maior de enchentes e um aumento do nível do mar mais elevado tomando nossas costas e destruindo nossos lares. Estamos cansados de contar nossas histórias de como a crise climática nos afeta, mas o Pacífico segue demonstrando liderança climática. Tuvalu e Vanuatu foram os primeiros Estados Partes a pressionar por um Tratado de Não Proliferação de Combustíveis Fósseis, e estamos aqui para mostrar a esses países que o Pacífico os apoia. Devemos manter a meta de 1,5 °C no texto final da COP27 e exigir a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis. As lideranças políticas precisam fazer o mesmo porque 1,5 °C de aquecimento não é apenas uma meta, é um limite.”
David Tong, Oil Change International
“Pesquisas revisadas por pares mostram que campos de petróleo e gás e minas de carvão que já produziam ou estavam em construção antes de 2022 detêm reservas de combustíveis fósseis suficientes para empurrar o mundo bem além dos 2 °C de aquecimento, que dirá de 1,5 °C. Mas, apesar dessa realidade, a indústria do petróleo e do gás continua aprovando novos projetos de extração que geram ainda mais poluição para o clima. Um novo estudo da Oil Change International revela que a produção de petróleo e gás já aprovada em 2022 – incluindo aquela sob risco de aprovação nos próximos três anos – pode alcançar 70 bilhões de toneladas de nova poluição de carbono, o equivalente a 17% do orçamento de carbono restante do planeta, relacionado à meta de 1,5 °C. E estamos falando apenas da nova produção. A produção em curso no início de 2022 já era suficiente para nos fazer ultrapassar 1,5 °C.”
A boa notícia é que quase 85% dessa produção ainda não obteve aprovação final. Decisões finais de investimento ainda não foram tomadas. Pessoas e comunidades estão se opondo a muitas delas. Tais decisões ainda podem ser interrompidas, e os governos precisam fazer sua parte. Os governos devem eliminar progressivamente os combustíveis fósseis, com base na equidade somada e em medidas justas de transição. É tarde demais para enfrentar um combustível fóssil de cada vez. Eliminar progressivamente o petróleo. Eliminar progressivamente o gás. Eliminar progressivamente o carvão. Vamos pôr isso no texto.