10 dezembro, 2021

Líderes indígenas do RS lançam protocolo inovador de consulta prévia a comunidades

Após vitória contra mina de carvão que seria instalada sem ouvir os povos afetados, os Mbya Guarani do Rio Grande do Sul definem como esperam participar da tomada de decisões sobre impactos às suas terras

Neste Dia Internacional dos Direitos Humanos, 10 de dezembro, lideranças indígenas Mbya Guarani do Rio Grande do Sul lançam o primeiro protocolo de consulta prévia desse povo indígena no estado e um dos primeiros do Brasil a ser elaborado por comunidades diretamente envolvidas em uma disputa jurídica sobre o futuro de seus territórios.

O documento define como as comunidades indígenas Mbya Guarani esperam participar de debates e decisões sobre obras de infraestrutura, mineração e outras atividades econômicas e medidas administrativas que os impactem, especialmente aquelas no entorno das terras onde vivem ou que podem afetar seu modo de vida a partir de danos ao meio ambiente e à sua cultura.

A participação dos povos indígenas na tomada de decisões potencialmente danosas a seus territórios está garantida pela Constituição brasileira e por tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, entre outros, que têm força de lei. 

No entanto, empresas e governos frequentemente ignoram esse direito ou confundem a consulta prévia, livre e informada com a realização de audiências públicas, muitas vezes em condições que as lideranças indígenas apontam como inadequadas ou insuficientes para estabelecer diálogo e entendimento. Isso leva a impactos negativos sobre as comunidades, sua cultura e seus modos de ser, além de criar insegurança jurídica para todas as partes.

A elaboração dos protocolos de consulta prévia visa a proteger os povos indígenas desse desrespeito, ao definir em detalhes os processos que uma determinada comunidade espera ver implementados para que sua participação no processo de decisão seja efetiva. 

No caso dos Mbya Guarani do Rio Grande do Sul, a publicação desse primeiro protocolo de consulta vem na sequência de uma vitória na disputa judicial com a empresa de mineração Copelmi, que tentou instalar a maior mina de carvão a céu aberto do Brasil em uma área próxima aos territórios indígenas e a menos de 20 quilômetros de Porto Alegre. 

O empreendimento poderia provocar impactos significativos à qualidade do ar e da água na região, além de uma série de danos aos modos de ser e viver das famílias que vivem em seu entorno. Por não terem sido consultadas, as comunidades entraram com uma ação civil pública contra o avanço da instalação da Mina Guaíba, apoiadas por organizações como a 350.org, e conseguiram interromper o processo de licenciamento, em fevereiro de 2020. Em agosto de 2021, uma nova decisão da Justiça confirmou a necessidade de uma consulta adequada aos povos indígenas da região.

Com o protocolo de consulta devidamente construído pelo coletivo de lideranças indígenas locais, as comunidades Mbya Guarani agora têm à disposição uma ferramenta para orientar a todos, principalmente governos e empresas, sobre como são realizados seus debates e processos de decisão.


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“Estamos mandando esse documento para os governos municipal, estadual e federal, para que todas as esferas respeitem os nossos direitos. Nós, do povo guarani, queremos essa segurança, inclusive do direito à nossa vivência, à nossa cultura e ao futuro das nossas crianças”, afirma o Cacique Cláudio, da Aldeia Tekoá Guajavy, no município de Charqueadas (RS).

“O povo Mbya Guarani do Rio Grande do Sul já mostrou sua força na vitória contra a Mina Guaíba, que está servindo de inspiração para comunidades afetadas pelos combustíveis fósseis em vários outros países. Com o protocolo de consulta em vigor, eles ficam ainda mais organizados e alinhados em relação à defesa de seus direitos, de seu território e de seu modo de vida”, explica Luiz Afonso Rosário, coordenador de campanhas da 350.org.

“Os Mbya Guarani tiveram um papel fundamental em evitar a instalação de uma mina que poderia prejudica a qualidade de vida de milhões de pessoas na Grande Porto Alegre. Por isso, esse protocolo de consulta é também um avanço para todos os gaúchos, à medida que fortalece ainda mais a luta da sociedade civil por um meio ambiente equilibrado e por um modelo de desenvolvimento que impulsione o estado para o futuro, e não para uma indústria poluente e ultrapassada, como a do carvão”, afirma Renan Andrade, coordenador de campanhas da 350.org no Rio Grande do Sul.


Informações para a imprensa

Peri Dias
Comunicação da 350.org na América Latina
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