Mesmo tendo garantido pela Justiça Federal do Rio de Janeiro o direito de ingresso e permanência pacífica nas 2a e 3a Rodadas de Partilha de Produção do Pré-sal, que aconteceram nesta sexta-feira (27), no Rio de Janeiro, a 350.org Brasil, única representante da sociedade civil presente, foi proibida de participar do leilão. Os ativistas apresentaram a liminar e o documento de salvo conduto, mas a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) alegou lotação no auditório, que estava visivelmente com vários lugares vazios.

“Barrar a sociedade civil num leilão público já é uma afronta. Fazer isso quando temos em mãos uma liminar judicial que nos garante o direito de entrada é ainda pior. É uma total falta de respeito com a população brasileira. Vemos seguidamente a ANP desrespeitar direitos básicos, como o direito à consulta livre, prévia e informada, o direito de acesso à informação e o direito de ir e vir. Mas seguiremos pressionando o governo em todas as esferas de poder para que nossa voz seja ouvida”, argumentou Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da 350.org Brasil e América Latina.

Na quarta-feira (25), a 350.org Brasil entrou com um Mandado de Segurança pedindo a anulação da 2a e 3a Rodadas, e a imediata suspensão das ofertas realizadas no leilão. O pedido tem por base o ato ilegal da ANP de negar acesso a pacotes de dados técnicos públicos, selecionados pela própria agência para a licitação, referentes a cada bacia sedimentar e setores onde se localizam os objetos ofertados. Segundo a denúncia, a ANP feriu a lei de acesso à informação e princípios da moralidade, da legalidade e da publicidade.

O leilão chegou a ser suspenso por mais de duas horas por conta de uma liminar da Justiça Federal do Amazonas, que afirmava que o leilão traz lesão ao patrimônio público, mas a decisão foi revertida pela Advocacia-Geral da União (AGU). Ao fim das negociações, 6 dos 8 blocos ofertados foram arrematadas. Os únicos que não receberam ofertas foram os blocos Pau Brasil, na Bacia de Santos, e o Sudoeste de Tartaruga Verde, na Bacia de Campos.

Os demais foram comprados por consórcios formados pelas gigantes do setor, como Shell, Total, Statoil, ExxonMobil, Petrogal, CNOOC, QPI, BP Energy e Repsol, além da Petrobras. A estatal brasileira aceitou ceder até 80% da produção para a União, e levou as três áreas para as quais demonstrou interesse – Sapinhoá, Peroba e Alto de Cabo Frio Central, onde há ocorrência de baleias Jubarte. Além do lucro da produção futura, as empresas vencedoras dos blocos terão de pagar um bônus ao governo na assinatura do contrato. A União receberá um total de R$ 6,15 bilhões com as concessões vendidas.

Segundo o diretor-geral da ANP, Decio Oddone, as áreas que não foram arrematadas voltarão para o banco da ANP e poderão ser ofertadas novamente em outro momento. Para ele, “o atraso no desenvolvimento do pré-sal foi um tempo perdido, que será recuperado agora.”

“A ANP só tem pensado no lucro econômico da exploração petrolífera, mas o que eles estão esquecendo é que isso irá afetar diversas comunidades, como os povos indígenas e pescadores, a biodiversidade marinha e costeira, além de agravar as mudanças climáticas, sujando a imagem do país internacionalmente. Com a intensificação dos investimentos em combustíveis fósseis, as emissões de gases do efeito estufa só irão crescer, colocando em risco o cumprimento das metas estabelecidas pelo próprio governo. Isso revela uma completa falta de compromisso e de palavra”, defendeu Juliano Bueno de Araujo, coordenador de campanhas climáticas da 350.org Brasil e fundador da COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida.

Na manhã de ontem, a 350.org Brasil realizou um protesto pacífico na Candelária, em frente à sede da ANP, no Centro do Rio. Os ativistas pediam mais transparência e responsabilidade por parte do governo brasileiro com relação aos impactos da exploração de petróleo e gás para o clima, a biodiversidade e as comunidades tradicionais. Um balão gigante foi inflado representando a poluição causada pela quantidade de carbono que será emitida com a exploração do pré-sal, e uma exposição de fotos mostrou as espécies ameaçadas nas áreas dos blocos ofertados, além de desastres naturais que poderão ser agravados com a intensificação das mudanças climáticas acarretadas por essas atividades.