Mobilização em leilão de petróleo ANP - 07/11/2019

Ativista da 350.org Brasil durante leilão da ANP em 2019

 

Nesta quarta-feira dia 2 de Junho, em um evento online liderado pela Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP), foi realizada uma Audiência Pública para discutir a inclusão de centenas de blocos de exploração de petróleo e gás em leilão permanente, ou seja, se aprovados, os blocos ficarão disponíveis para quem se interessar, como em um outlet

Na ocasião, estiveram na mesa Renato Lopes Silveira (Presidente da Audiência Pública), Hudson de Moraes Filadelfo (Secretário da Audiência Pública), Rafael dos Santos Bonfim (Procurador da Audiência Pública), Nilce Costa, Coordenador Geral de Meio Ambiente da ANP, e Josie Quintela, Superintendente Adjunta da Superintendência de Promoção de Licitações, todos representantes da ANP, e, os únicos a falarem como sociedade civil, foram Ilan Zugman, diretor da 350.org América Latina, e Dalcio Rocha, do Fridays For Future Brasil que foi ouvido ao final da audiência demonstrando total dissonância dos preceitos legais que devem reger uma audiência. Na ocasião, Zugman expôs que outras organizações se inscreveram para falar no evento, porém, estranhamente, somente a 350.org havia sido aprovada como expositora. Além disso, criticou o fato de não haver mais participação da sociedade civil, como os povos e comunidades tradicionais, através de suas lideranças representativas, que serão os maiores impactados pelo resultado de uma exploração de petróleo e gás.

“Gostaria de manifestar meu total repúdio a esse tipo de leilão de oferta permanente, onde estamos falando de áreas distribuídas por todo o país por terra e por mar, em áreas extremamente sensíveis, sendo ao todo mais de mil blocos que impactarão não somente os nossos biomas, como também povos e comunidades tradicionais. Parece que o Brasil não está observando o que está acontecendo em todas as partes do mundo, principalmente Estados Unidos e Europa, mas quero aproveitar que estou vendo aqui no chat pessoas da Total, Exxon, Chevron, Shell, para deixar uma mensagem aos investidores e petroleiras: 

Imagino que vocês tenham visto o que aconteceu com a Shell na semana passada quando foi condenada pelo tribunal de Haia, e obrigada a reduzir suas emissões. Assim como o que aconteceu com a Exxon Mobil, que está perdendo participação dentro do seu próprio conselho, sendo obrigada a também reduzir emissões, e muitas outras decisões importantes como da própria Agência Internacional de Energia, que emitiu um relatório há duas semanas afirmando que para conseguir manter o planeta em 1.5°C, em um ambiente saudável para as futuras gerações, nós não podemos ter à partir desse ano, novos investimentos em petróleo, gás e carvão. Então, a mensagem para vocês, investidores, financiadores e empresas de combustíveis fósseis: Nós e a sociedade civil faremos de tudo para evitar que esses blocos não sejam comprados e não recebam oferta. E, caso recebam, faremos resistência e adiaremos ao máximo possível o licenciamento desses blocos para que eles fiquem cada vez mais inviáveis e que tenham cada vez menos investidores.“, disse Zugman em sua fala.

Em defesa da ANP, Nilce Costa, Coordenador Geral de Meio Ambiente do órgão, comentou que realmente estamos em um caminho irreversível de mudança no cenário energético, entretanto, ainda enxerga o fomento do mercado. 

“Enquanto tiver interesse, não há porque perder a oportunidade de monetizar”, afirmou Costa, representante da ANP.

Em seguida, falou o jovem ativista do Fridays For Future, Dalcio Rocha, que defendeu sua geração que será a maior impactada nos próximos anos. Dalcio pontuou a fala de Nilce Costa: 

“Gostaria de lembrar a todos que o nosso planeta vale muito mais quando ele está de pé, vivo. A Era dos Combustíveis Fósseis está acabando e a ANP deveria estar sabendo disso, mas não está fazendo nada contra!”, retrucou o jovem Dalcio Rocha. 

Não bastasse o afronte ao planeta, cada perfuração em solo ou mar brasileiro, impacta diretamente os biomas e a vida de milhares de famílias que necessitam de recursos naturais livres da contaminação do petróleo e gás e que vivem em comunidades tradicionais do Brasil, sem contar ainda com os milhões de brasileiros que dependem dos recursos hídricos, superficiais e profundos, para a manutenção de suas economias e da água com qualidade para beber.

Se somados os blocos permanentes já disponíveis com os blocos que estão entrando em discussão na audiência pública, teremos ao todo 1068 blocos por todo o território brasileiro. Sendo que 522 blocos em bacias terrestres – em mais de 10 estados brasileiros e 546 blocos em bacias marítimas – praticamente todo o litoral do país.

Entre os blocos terrestres (onshore), 61 estão na Amazônia Legal, de modo que:

  • 23 territórios indígenas serão diretamente impactados, pois estão a distâncias irrisórias  de alguns dos blocos, e outros completamente cercados por blocos;
  • 17 unidades de conservação serão diretamente impactadas também por estarem a menos de 5km dos blocos, e um dos blocos por estar dentro de uma unidade de conservação;
  • 2 comunidades quilombolas serão diretamente impactadas, por fazer fronteira e outra por estar dentro de um bloco;
  • Há possíveis impactos nos maiores rios e aquíferos do mundo: Rio Amazonas e Aquífero Alter do Chão.
  • Há incontáveis áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade que serão impactadas.

Em carta, o cacique Ninawa Huni Kuin, representante dos povos da Amazônia, pede para que autoridades para que não permitam a exploração de petróleo e gás na Amazônia. 

“A Amazônia tem grande importância para nós e para toda a humanidade. Não podemos ver a Amazônia apenas como um produto de grande comércio. É tão importante que representa a vida mundialmente e não é aceitável que projetos como prospecção de petróleo, de gás tenham um valor maior que uma vida.

Quando se explora a Amazônia para o comércio está favorecendo apenas lucros de bancos e empresas, enquanto promove destruição de vidas, animais e de medicinas. Os interesses econômicos governamentais avançam destruindo em nome do “desenvolvimento” para poucos e deixam um rastro de destruição que não será restaurada.” – leia a carta completa

Representante da comunidade de pescadores artesanais da Baía da Guanabara, Alexandre Anderson, presidente da AHOMAR também se manifesta: 

“Só a circulação dos navios necessários à exploração já prejudicaria a atividade da pesca artesanal, que emprega tanta gente na região. Além disso, sabemos que pequenos vazamentos não são incomuns nas áreas de extração, o que causaria um prejuízo enorme às comunidades”, diz Anderson.

No detalhe dos blocos da oferta permanente

Na audiência pública de hoje, dia 2 de junho, entraram em discussão 377 blocos localizados em 72 setores de 17 bacias sedimentares brasileiras. Desta totalidade, 72 blocos estão nas bacias terrestres, além de 305 blocos nas bacias marítimas.

Desses blocos discutidos em Audiência Pública, foi feito um levantamento dos que estão na Amazônia Legal:

  • 8 blocos estão na Bacia do Amazonas (Amazonas e Pará): sendo que estão a menos de cinco quilômetros de 3 Territórios indígenas e unidades de conservação.
  • 20 blocos estão na Bacia do Parecis (Mato Grosso): a menos de cinco quilômetros de 7 Territórios Indígenas, sendo que 2 territórios estão completamente cercados por 4 blocos. Além disso, 6 unidades de conservação estão a menos de cinco quilômetros dos blocos.
  • TOTAL: 10 Territórios Indígenas e 9 Unidades de Conservação estarão muito próximas aos blocos (menos de 5km).

Some a esses, os blocos que já estão em oferta permanente, que são 691 blocos localizados em 51 setores de 15 bacias sedimentares brasileiras, totalizando 247.483,543 km². Desses, 450 blocos nas bacias terrestres, e 241 blocos nas bacias marítimas.

Desses blocos já em oferta, fizemos um olhar clínico sob a Amazônia Legal:

  • 13 blocos estão sob a Bacia do Amazonas (Amazonas): a menos de cinco quilômetros de 6 Territórios Indígenas e 8 Unidades de Conservação, sendo que um bloco está dentro de uma UC de proteção integral.
  • 21 blocos estão sob a Bacia do Parnaíba (Maranhão): a menos de cinco quilômetros de 7 Territórios Indígenas sendo que um bloco está dentro de uma comunidade quilombola e fazendo fronteira com outra
  • TOTAL: 13 Territórios Indígenas, 8 Unidades Conservação, e 2 comunidades quilombolas muito próximas aos blocos, correndo sérios riscos de impactos diretos.
  • OBS: Vale lembrar também que, mesmo sob o crivo do poder judiciário, o bloco Camamu-Almada (bloco próximo a Abrolhos) também segue na oferta permanente. >> Veja como foi o leilão em que Abrolhos foi leiloada 

Infelizmente, Amazônia, Pantanal, Nordeste Brasileiro, Abrolhos, Rio de Janeiro, Mata Atlântica, importantes áreas da pesca artesanal do Sul, entre outras regiões que são motivo de orgulho dos brasileiros correm o risco de serem impactados pela indústria do petróleo e do gás. 

E nosso país corre o risco de virar um grande queijo suiço com tantas perfurações, pois, mais uma vez, a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP), coloca em xeque os limites do clima, da vida e do equilíbrio ambiental.

 

Veja os mapas

Mapeamos os blocos disponibilizados pela Oferta Permamente da ANP na Amazônia Legal e cruzamos com Territórios Indígenas e Unidades de Conservação. Confira as áreas e os territórios impactados pela decisão do órgão.

Unidades de Conservação em risco na Amazônia Legal:


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Territórios Indígenas em risco na Amazônia Legal:


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Livia Lie – Digital Campaigner da 350.org América Latina