Ativistas se sujam de óleo para representar os impactos da exploração de petróleo e gás, durante protesto no último leilão da ANP (Foto: Juliana Colussi/350Brasil/COESUS).

 

O atual governo brasileiro apostou mesmo na reabertura do mercado petrolífero para levantar a economia do país. Desconsiderando os impactos diretos à biodiversidade, o desrespeito aos direitos mais fundamentais de diversas populações e a demanda global por um novo modelo de desenvolvimento econômico-energético, a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) vai realizar, na próxima sexta-feira (27), mais duas rodadas de licitações de blocos para exploração de petróleo e gás. Dessa vez, as protagonistas serão as profundas camadas do pré-sal. No total, oito áreas serão oferecidas durante a 2ª e 3ª Rodadas, todas elas na Bacia de Santos, localizada entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo.

Estão confirmadas 10 empresas para a 2ª Rodada e 14 para a 3a. Muitas delas são as mesmas empresas interessadas nos blocos da 14ª Rodada, que aconteceu há exatamente um mês. Entre elas estão grandes nomes do setor petrolífero mundial, como Shell, ExxonMobil, Repsol, Petronas e BP. A Exxon, vencedora inconteste do último leilão, promete entrar com força novamente, numa investida certeira nas áreas brasileiras a fim de reabastecer suas reservas, em queda nos últimos anos por conta da baixa no preço do barril de óleo.

As áreas do pré-sal são ofertadas sob o regime de partilha. Nesse tipo de licitação, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) decide se a Petrobrás será a detentora de todos os direito de exploração daquela área ou se vai dar espaço para consórcios com outras empresas. Ao contrário do regime de concessão, no qual a empresa assume todo o risco na exploração do petróleo, o regime de partilha não dá o direito de livre comercialização por parte da empresa investidora. Assim, uma parte do lucro da produção vai diretamente para os cofres da União.

Uma lei aprovada no ano passado, porém, muda a maneira como os leilões do pré-sal serão realizados. Antes, a participação da Petrobras em no mínimo 30% das atividades nessas áreas estratégicas era obrigatória. Agora, a estatal pode decidir se quer ou não essa participação. Isso muda completamente a lógica do primeiro leilão realizado em 2013, que ofertou a área do bloco de Libra e terminou num consórcio da Petrobras e outras quatro empresas: Shell, Total, CNPC e CNOOC. Com a nova lei, as empresas terão liberdade para explorar os blocos com o consentimento ou não da Petrobras.

Neste leilão, a Petrobras optou por ser operadora com participação de 30% no bloco Campo de Sapinhoá, a ser ofertado na 2ª Rodada, e também com 30% nos blocos de Peroba e Alto de Cabo Frio – Central, ambos na 3ª Rodada.

Emissões previstas do pré-sal

A camada do pré-sal é um imenso reservatório de petróleo, com cerca de 149 mil quilômetros quadrados, localizada abaixo do leito do mar, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. O petróleo encontrado ali fica a uma profundidade de mais de 7 mil metros, abaixo de uma extensa camada de sal. A Petrobras confirmou a descoberta do pré-sal em 2007 e começou a explorar a camada em quantidade reduzida em 2008.

Estimativas apontam que toda a camada pode abrigar cerca de 80 bilhões de barris de petróleo em reservas, colocando o Brasil entre os dez maiores produtores do mundo. Mas o que a propaganda do governo não fala é que a exploração dessas reservas e a queima de todo esse combustível também irá subir a colocação do Brasil no ranking dos maiores vilões para o clima, uma vez que aumentaria significativamente as emissões de gases do efeito estufa do país.

Os últimos dados divulgados pelo Sistema de Estimativa de Emissão de Gases de Efeito Estufa (SEEG), compilado pelo Observatório do Clima, mostram que o país emitiu 1,9 bilhão de tonelada de CO2 no ano de 2015. Segundo estimativas, apenas dois dos blocos ofertados na 3a Rodada, o Peroba e o Pau Brasil, rendem, respectivamente, em torno de 5,3 e 4,1 bilhões de barris, o que significa que poderão liberar cerca de 5,4 bilhões de toneladas de CO2 equivalente a mais para a atmosfera.

Além disso, o mecanismo de extração de petróleo por si só já causa muitos prejuízos. O fundo do mar conta com uma grande concentração de gás carbônico. Retido na camada pré-sal por milhões de anos, em escala geológica, o monóxido de carbono será transferido para a superfície em apenas algumas décadas. As emissões estimadas somente para esse montante de CO2 presente nos reservatórios superam os 3 bilhões de toneladas.

O uso de combustíveis fósseis como petróleo, carvão e gás é um dos grandes responsáveis pelo aquecimento global. Em uma época em que se fala tanto em desenvolvimento sustentável e no uso de energias limpas e livres, é no mínimo contraditório que o governo insista em investir em um processo que traz tantos danos, para utilizar fontes ultrapassadas, cujo próprio nome remete ao tempo dos dinossauros.

Segundo a organização Climate Action Tracker, que monitora o progresso de vários países para alcançar as metas do Acordo de Paris, se todos os países seguissem a política climática atual do governo brasileiro – considerada insuficiente mesmo antes do pré-sal -, o aquecimento global ficaria entre 2o e 3oC.

Seguindo nessa toada, portanto, será simplesmente impossível o Brasil diminuir em 30% as emissões de gás carbônico até 2020, como prometeu internacionalmente. O objetivo de limitar o aquecimento global abaixo dos 2oC passa pelo abandono urgente das fontes fósseis. Mas parece que o governo brasileiro se esqueceu dessa parte.