25 março, 2024

Principais conclusões do relatório da rede Resistência Amazônica sobre a operação da Eneva no Campo de Azulão

A operação de extração de gás pela Eneva no Campo de Azulão, no sul do Amazonas, provoca uma série de graves impactos socioambientais, como detalha o relatório lançado em 25 de março pela rede Resistência Amazônica.

Entre as conclusões mais importantes, destacam-se:

Licença irregular

A operação da Eneva no Campo de Azulão é irregular, em primeiro lugar, porque a licença de pesquisa foi concedida pelo órgão estadual de meio ambiente, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), quando a análise sobre os impactos do empreendimento deveria ser feita pelo órgão responsável por licenciamentos na esfera federal, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), uma vez que a atividade da empresa impacta povos indígenas.

Além disso, o empreendimento também pode produzir impactos sobre o território paraense, uma vez que as operações localizam-se próximo à divisa com o Pará. Atividades que impactam mais de um estado devem ser licenciadas pelo órgão federal, segundo a legislação.

Impactos sobre povos indígenas e ribeirinhos

O relatório aponta um conjunto de impactos e riscos à população indígena da região, que inclui pelo menos 275 famílias, pertencentes aos povos Mura, Munduruku e Sateré-Mawé, moradoras de oito aldeias nos municípios de Silves e Itapiranga.

Um dos principais impactos é o empobrecimento da fauna. Lideranças indígenas como o Cacique Jonas Mura apontam que as explosões e a presença frequente de chamas e fumaça nos locais de extração de combustíveis fósseis afugentam os animais silvestres de uma ampla área ao redor das instalações da Eneva. Isso reduz a possibilidade de caça pelos indígenas e, consequentemente, prejudica a alimentação e a manutenção das tradições e da cultura nas aldeias.

Além disso, as comunidades relatam o deslocamento forçado de moradores e a desestruturação de atividades econômicas e de subsistência devido ao barulho de máquinas e veículos e aos sustos frequentes com as explosões associadas à operação da Eneva. A fuga dos locais de operação está tornando as comunidades mais dispersas e desorganizando a vida social dos povos afetados.

Outro problema central é o risco de contaminação das fontes de água que abastecem as famílias. Moradores relatam mudança na coloração da água desde a chegada da Eneva à região, o que levou à adoção forçada de um sistema de SALTA-Z, solução de tratamento desenvolvida pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para comunidades que não possuem acesso à água potável. 

Impactos sobre indígenas em isolamento voluntário

Reforçando depoimentos divulgados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) em novembro, o relatório da rede Resistência Amazônica aponta que é bastante provável que comunidades indígenas em isolamento voluntário vivam na região afetada pelas operações da Eneva. Agentes comunitários acreditam que sejam grupos dos povos Pariquis.

O relatório traz a público, pela primeira vez, uma fotografia tirada por membros da equipe da CPT em visita à Comunidade Santa Isabel, em Itapiranga (AM), em agosto de 2023, para constatar os impactos da exploração de gás fóssil pela Eneva. Quando os agentes estavam no território das comunidades ribeirinhas e povos indígenas, houve um contato acidental com esse grupamento isolado e um dos componentes da equipe capturou o momento em que um indivíduo do grupo isolado foi visto, carregando um objeto e bastante camuflado pela vegetação. Depois, mais pessoas foram vistas e houve uma rápida interação entre os agentes e os indígenas, como descrito em detalhes no relatório.

O estudo reforça também a necessidade de uma observação mais aprofundada, pela FUNAI, sobre a presença de comunidades em isolamento voluntário naquela área. A investigação sobre a presença desses grupos é relevante porque o Estado tem a obrigação de proteger comunidades em isolamento voluntário de potenciais agressões externas, tais como a operação da Eneva na região.

Danos ambientais

Além da já mencionada transformação no aspecto da água que abastece as comunidades, a extração de gás fóssil gera o risco de contaminação por produtos químicos do Aquífero Alter do Chão, um dos maiores do mundo em volume, o que acarretaria danos para uma área bem maior do que a do entorno das perfurações.

A redução da fauna na região também prejudica o equilíbrio ambiental e as condições de vida da população.

Por fim, como qualquer outra operação de extração de gás, a atividade da Eneva alimenta a cadeia de combustíveis fósseis, principal responsável pela crise climática global que põe em risco a vida humana em todo o planeta.