O Fórum Alternativo Mundial da Água terminou nesta quinta-feira (22), Dia Mundial da Água, deixando a seguinte mensagem: “Água não se vende, se defende” e “Água é direito, não mercadoria”, defendendo a água como um bem comum, que deve ser controlado e estar a serviço do povo. Reunidos em Brasília desde o dia 17, povos tradicionais, movimentos sociais, organizações não governamentais e ativistas assinaram conjuntamente a declaração final do encontro, que reafirma a luta contra a privatização e o estabelecimento de propriedade privada sobre esse escasso recurso.

A carta sintetiza as discussões e deliberações tomadas durante as diversas plenárias, debates, oficinas e demais atividades realizadas no Fama, e repudia atividades exploratórias de indústrias como o agronegócio, a mineração e de geração de energia, principalmente através de combustíveis fósseis e pelo fracking, que contaminam águas superficiais e aquíferos. O documento faz aborda também a importância da defesa da democracia, pois “só por meio de processos democráticos é que os povos podem construir o controle social e o cuidado sobre as águas”.

A carta também traz uma crítica ao Fórum Mundial da Água, evento “oficial” que reuniu governos, empresas, parlamentares, juízes e especialistas. “O resultado desejado pelas corporações é a invasão, apropriação e o controle político e econômico dos territórios, das nascentes, rios e reservatórios, para atender aos interesses do agronegócio, hidronegócio, indústria extrativista, mineração, especulação imobiliária e geração de energia elétrica”, diz trecho da declaração.

Durante o fórum alternativo também foram lembrados crimes ambientais, a perseguição e assassinato de lideranças e defensores do meio ambiente e dos direitos humanos. Segundo o último levantamento da organização Global Witness, o Brasil segue sendo o país mais letal para ambientalistas.

Antônia Melo, integrante do movimento Xingu Vivo para Sempre, se posicionou contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte. “A água é vida para todos os povos, mas ela é essencial para os povos e as comunidades tradicionais. Eles não podem viver sem um rio para pescar, não podem viver sem o seu pedaço de terra plantado na beira do rio para ter o seu alimento. Retirá-la deles é uma tirania, é um crime contra a humanidade”, defendeu.

 

O cacique da Terra Indígena Recanto dos Encantados e representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Junior Xukuru, chamou os presentes a “ouvir mais a natureza”. “Os encantados estão dizendo que estão muito mais felizes por estarmos aqui defendendo a água. Nossas nascentes estão sendo mortas e muitos já tombaram em defesa da água, da mãe terra e de nossos territórios”, frisou.

Zanete, pescadora do delta do Parnaíba, chamou a situação em sua região de “extermínio”: “Água é saúde, sobrevivência. É um latrocínio o que estão fazendo com nossos territórios. Quem vive da pesca tradicional usa os rios como meio de sobrevivência. Os corruptos se unem para envenear nossas águas e nós nos unimos pela libertação da vida.”

O Fama reuniu mais de 7 mil pessoas, articuladas em 450 organizações nacionais e internacionais de todos os continentes, entre representantes de povos originários e comunidades tradicionais, movimentos populares, tradições religiosas e espiritualidades, organizações não governamentais, universidades, pesquisadores, ambientalistas, organizados em grupos, coletivos, redes, frentes, comitês, fóruns, institutos, articulações, sindicatos e conselhos.

Em nome de quê?

 

Também ocorreu hoje, num dos espaços do Fórum oficial, o lançamento da campanha “Em Nome de Quê”. Desenvolvida pela organização Uma Gota no Oceano, com apoio de parceiros como a 350.org Brasil, a COESUS (Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida) e a Fundação Internacional Arayara, a campanha tem por objetivo mobilizar a sociedade em relação às ameaças que representam as intervenções em nascentes, mananciais e rios, a desconsideração dos direitos dos povos tradicionais, o desrespeito ao meio ambiente, a visão que não leva em conta as futuras gerações e o foco no lucro.

“Os rios são as artérias do planeta. É preciso que eles corram livres e limpos, para garantir a todos o sagrado direito à água, essência da vida. Em nome de quê estamos ferindo mortalmente nossos rios e comprometendo tão seriamente o nosso futuro?” Questionamentos como esse estão colocados no documentário lançado junto com a campanha, que conta com direção do cineasta Luiz Fernando Carvalho e narração da atriz Dira Paes.