Henrique Andrade Camargo, do Mercado Ético, e Efraim Neto, da Envolverde – https://mercadoetico.terra.com.br/arquivo/350org-planta-sementes-no-brasil/
Você já sabe onde estará no dia 24 de outubro? Se não sabe, a californiana Kelly M. Blymm, diretora da 350.org para a América Latina, pode dar algumas dicas. É que nesse dia, a organização para a qual trabalha fará uma grande ação global. O objetivo é pressionar os governantes mundiais por um acordo climático em dezembro, na cidade de Copenhague.
Na entrevista que concedeu aos jornalistas do Mercado Ético e da Envolverde, Blymm explica tudo sobre o cabalístico número 350 e a razão de se escolher o dia 24 de outubro para realizar as manifestações.
Mercado Ético/Envolverde – Afinal, de onde vem o nome 350?
Kelly M. Blymm – Primeiro de tudo, 350.org é uma campanha focada no combate ao aquecimento global, que teve início há um ano e meio. Nosso grande objetivo é influenciar as decisões dos líderes mundiais, que vão se reunir em dezembro, na cidade de Copenhague. Basicamente, queremos mobilizar jovens, estudantes, artistas, escritores e gente de todo tipo para uma grande manifestação ao redor do mundo, no dia 24 de outubro. Queremos que os líderes concordem em baixar as emissões de CO2, para que a concentração do gás na atmosfera fique abaixo de 350 partes por milhão. De acordo com os cientistas, esse é o nível seguro para a vida no planeta. Atualmente, a concentração está acima dessa marca e já causa muitos impactos em todo o mundo.
ME/E – A ação do 350.org teve início com a internet. Qual a importância da rede mundial de computadores para a campanha?
KMB – A internet tem um papel fundamental no 350.org. Sem ela, nada disso seria possível. Por meio da rede, pudemos reunir dezenas de milhares de pessoas de diferentes partes do globo em um ambiente virtual. Hoje, nosso site está escrito em dez diferentes idiomas.
ME/E – Foi a internet que te trouxe para o Brasil?
KMB – Acho que até dá para dizer isso. Foi por meio da internet que o pessoal de Belo Horizonte entrou em contato comigo e me convidou para participar da Conferência Brasil 2020 (evento que faz parte do 2020 Climate Leadership Campaign, organizado pela State of the World Forum).
ME/E – Como estão as conexões do 350.org aqui no Brasil?
KMB – Na verdade estamos começando agora. Tenho feito contato com alguns grupos que são bem ativos em ações contra a mudança climática e também com alguns grupos religiosos. Espero ampliar minha rede em Belo Horizonte.
ME/E – Por que as ações serão concentradas no dia 24 de outubro?
KMB – Escolhemos essa data, em primeiro lugar, porque é o dia das Nações Unidas, e nossas ações são voltadas para a ONU. Também, estaremos mais perto do encontro em Copenhague. Poderemos pressionar por um acordo que beneficie o planeta. Se fizermos depois de dezembro, não fará muito sentido. Queremos um acordo em Copenhague que diminua as emissões. Se não houver esse acordo, os países mais pobres são os que serão mais atingidos.
ME/E – Há um senso comum de que a temperatura média do planeta não pode subir mais do que 2°C. O que se debate é onde os cortes de emissão devem ser feitos. Você acha que os países mais ricos devem cortar mais suas emissões devido às suas ações históricas?
KMB – Com certeza. Os países mais desenvolvidos têm mais responsabilidade e devem não só cortar as emissões, mas dar apoio aos países mais pobres para que possam lidar com as conseqüências das mudanças climáticas. Eles têm a obrigação de financiar as grandes mudanças que precisamos no mundo.
ME/E – Mas você não acha que, por exemplo, a China, o país que mais polui atualmente, deveria cortar suas emissões também? Afinal, toda aquela poluição também vai para a atmosfera.
KMB – Eu não acho que a China deveria cortar tanto quanto os países europeus e os EUA, até porque, as emissões per capita chinesas ainda são baixas. Mas claro que o aquecimento global é um problema e todos. Então, acho que a China deveria ter apoio para promover uma economia de baixo carbono.
ME/E – Aparentemente isso não vai acontecer. A China continua e, pelo que parece, continuará investindo em fontes de energia suja. Isso, em termos econômicos, pode ser interessante não só para os chineses, como também para os EUA e a Europa, que recebem boa parte do que é produzido naquele país.
KMB – Um acordo global deve mudar a forma como o mundo funciona. O consumo desenfreado é uma grande parte disso. Então, os gastos com alimentos, bens e todo aquele plástico que compramos da China têm que diminuir. Para isso, é preciso mudar também a consciência das pessoas ao redor do mundo.
ME/E – De acordo com uma pesquisa da Cohn & Wolfe, o público jovem é o que mais tem poder de promover uma economia verde. O 350.org é um exemplo disso, não?
KMB – Eu acredito que os jovens perceberam que esse é um problema que interfere diretamente no futuro deles. Além disso, também estamos mais conectados com as novas tecnologias e acreditamos que coisas impossíveis são possíveis.
ME/E – Então as pessoas mais velhas estão fora disso?
KMB – De forma nenhuma. Só acho que os jovens são mais ativos nessas questões. Mas todos devem estar engajados.
ME/E – Como está o engajamento da América do Sul nessa questão?
KMB – As pessoas estão bem envolvidas. Acho que todos estão percebendo que não temos muito tempo para reverter a situação. Temos diversas ações planejadas no continente para o dia 24 de outubro. A cada vez que abro meu email, vejo mais e mais pessoas com planos para esse dia. As pessoas estão planejando todos os tipos de atividades, como shows, ralis, passeatas, workshops educacionais etc.
ME/E – E nos Estados Unidos?
KMB – Está tudo indo muito bem. Temos mais de 600 ações planejadas até agora. Há uma grande mobilização para que tornemos nossa matriz energética mais limpa.
ME/E – Dá para ser otimista de que conseguiremos baixar as emissões a ponto de que a concentração de carbono na atmosfera fique em 350 partes por milhão?
KMB – Eu tenho que ser otimista para fazer esse trabalho. Mas acho que há muito para ser feito. É preciso muita colaboração entre os países. Os cientistas não sabem por quanto tempo vamos agüentar se ficarmos acima dessa marca.