Juliana Russar e Paula Collet(*)
Há poucos dias, foi divulgada a notícia de que setembro de 2012 empatou com o mesmo mês de 2005 como o setembro mais quente da história (os registros começaram em 1880). Somado a esse recorde temos o fato de que a temperatura média global dos últimos 331 meses está acima da média histórica e que, em agosto de 2012, pela primeira vez no registro histórico, a cobertura de gelo marinho do Ártico atingiu menos de 4 milhões de quilômetros quadrados, sendo a maior perda de gelo no Ártico já registrada.
Não é difícil ligar os pontos entre as mudanças climáticas que já estão acontecendo aos eventos climáticos extremos cada vez mais frequentes e intensos e seu impacto na vida das pessoas, causando mortes, prejuízos econômicos, afetando nossa saúde, etc. Só para citar dois exemplos, no começo de setembro, a cidade de São Paulo teve o dia mais quente do inverno dos últimos 57 anos e, em janeiro, mais uma vez as chuvas de verão causaram enchentes e desmoronamentos, atingindo e afetando milhares de pessoas nos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Os cientistas estão fazendo sua parte ao tornarem públicas e divulgarem da maneira que podem informações qualificadas que servem de alerta para um dos problemas mais complexos que a humanidade enfrenta no século XXI. As pessoas também já estão sofrendo com as consequências do aquecimento global. Por que, então, os líderes mundiais não estão nos ouvindo e adotando em conjunto uma série de medidas para enfrentar as mudanças climáticas? Por que as rodadas de negociações internacionais multilaterais sobre mudanças climáticas não avançam? Por que a ciência parece ser incompatível com a política?
A resposta é dura, mas é simples. Chegar a um acordo global para implementar medidas a nível nacional e local para atacar as causas das mudanças climáticas, reduzindo drasticamente as emissões de gases de efeito estufa, implica em uma mudança profunda na maneira como produzimos energia e como exploramos nossas florestas. Explicando melhor: precisamos parar de explorar petróleo, carvão e gás natural para gerar energia e precisamos parar de desmatar nossas florestas.
Porém, de acordo com as regras atuais do jogo, a indústria de combustíveis fósseis pode emitir sem pagar nada quanto carbono quiser na atmosfera, pois não existe nenhuma taxa ou punição para que pare de emitir (e, inclusive, recebe bilhões de dólares anualmente em subsídios ao redor do mundo para executar suas atividades) e isso não vai existir enquanto o poderoso lobby desse setor continuar infiltrado nas capitais federais, frequentando as negociações internacionais e influenciando os líderes mundiais, por meio do financiamento das suas campanhas políticas.
É por isso que, atualmente, a 350.org tem como alvo de campanha a indústria de combustíveis fósseis, pois sabemos que as reservas de petróleo, carvão e gás natural dessas empresas excedem 2.795 gigatoneladas de CO2 ou 5 vezes mais do que podemos emitir se quisermos evitar mudanças climáticas catastróficas, porém a lógica de negócio deles não leva em conta suas consequências.
Acreditamos que somente um movimento formado por cidadãos organizados de todo o planeta em busca de soluções para a crise climática tem força política suficiente para denunciar o que essas empresas estão planejando e mudar a realidade de baixo para cima. É importante dizer que esse crescente movimento abrange pessoas com os mais diferentes perfis, já que para um problema desse tamanho, é necessário muita criatividade e diversidade em busca de uma solução à altura. Não podemos mais esperar as soluções, precisamos ir em busca delas, daí a razão pela qual dizemos que ela virá de baixo para cima. Cada voto, cada compra, cada escolha que fazemos e cada manifestação e denúnica que desistimos de fazer têm consequências brutais nas nossas vidas.
Por isso, temos que sair da posição de conforto para tomar uma posição pelo fim do desmatamento, pelo fim dos subsídios aos combustíveis fósseis, pelo uso de energias limpas, mostrando para os nossos representantes políticos que há milhões de pessoas no mundo que já estão agindo e que eles têm nosso apoio nessa transição para um modelo de desenvolvimento com baixa emissão de carbono, levando-nos para um mundo com energias limpas e renováveis, seguro e digno para as futuras gerações.
*Juliana Russar e Paula Collet são coordenadoras da 350.org no Brasil
Artigo publicado originalmente na edição de outubro do Jornal Cidadania da Fundação Casper Líbero