A região de Presidente Prudente, extremo oeste de São Paulo, deu mais um importante passo no processo de banimento do fraturamento hidráulico, mais conhecido como fracking, técnica não convencional para exploração do gás de xisto. O juiz Márcio Augusto de Melo Matos, da 5ª Vara Federal de Presidente Prudente, julgou procedente uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e determinou a suspensão dos efeitos da 12ª Rodada de Licitações promovida pela Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP) com relação aos blocos localizados na Bacia do Rio Paraná. Na ação, o MPF aponta potenciais riscos ao meio ambiente, à saúde humana e à atividade econômica regional.

A sentença publicada nesta terça-feira (3) confirmou uma liminar já concedida anteriormente. A decisão suspendeu também todos os efeitos dos contratos de concessão firmados entre a ANP e as empresas Petrobras, Petra Energia S/A e Bayar Empreendimentos. O juiz ainda proibiu a ANP de promover outras licitações de blocos exploratórios na região enquanto não forem realizados estudos técnicos científicos que demonstrem a viabilidade do uso dessa técnica em solo brasileiro.

Para José Lira, advogado especializado em direito ambiental e coordenador regional da COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida, a sentença é uma decisão histórica, mas que ainda precisa ser consolidada por outras ações em todas as esferas governamentais. “O papel do MPF de alertar a Justiça foi fundamental. A decisão traz uma certa tranquilidade para a região, mas ainda há muito a ser feito, principalmente com relação às legislações municipais. Temos que avançar na discussão não só na região, mas também a nível nacional. Esse é o papel da COESUS: informar, conscientizar e buscar solução para proteger nossas terras, pensando sempre nas gerações presentes e nas futuras.”

Abrangendo 53 municípios, a região é considerada uma das últimas fronteiras do desenvolvimento paulista, onde a indústria do fraturamento hidráulico tem investido forte. A fim de barrar essa que é uma das práticas mais danosas à saúde humana, animal e do meio ambiente, cientistas, juristas e ativistas climáticos têm organizando palestras para conscientizar as comunidades e orientar os legisladores municipais a barrar essa técnica.

“Precisamos continuar mobilizando os municípios para que eles aprovem leis municipais que proíbam o fracking, e não dependam só de uma decisão da Justiça Federal. Depois que conseguirmos proteger todos os municípios precisamos ainda focar numa lei federal que deixe todo o subsolo brasileiro livre do fracking. Essa foi uma grande vitória e um reconhecimento do grande esforço que estamos fazendo na região, mas nosso trabalho continua”, frisou Juliano Bueno de Araujo, coordenador de campanhas climáticas da 350.org Brasil e fundador da COESUS.

Seminário sobre riscos do fracking

O processo do fraturamento hidráulico quebra as finas camadas do folhelho de xisto através da injeção de uma enorme quantidade de água sob pressão, misturada a areia e outras centenas de produtos químicos, muitos deles contaminantes e cancerígenos, que provocam pequenas explosões na rocha, liberando o gás.

O Ministério Público Federal destaca que os impactos ambientais causados pela adoção dessa técnica são “incomensuráveis”. Em curto prazo, pode-se verificar a contaminação das águas superficiais e subterrâneas, do solo e do ar, além de potenciais vazamentos, acidentes com transporte e manipulação de materiais perigosos. Uma das mais importantes reservas de água doce do mundo e a segunda maior da América Latina, o Aquífero Guarani, está localizado nos territórios do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, e também está em risco. No Brasil, um dos locais que abriga o aquífero é justamente a região de Presidente Prudente.  

A ação do MPF cita ainda que um parecer técnico emitido pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional de Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás (Gtpeg), instituído pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), aponta insuficiência de elementos para uma tomada de decisão quanto à exploração segura do gás de xisto.

“Existem diversos trabalhos de importantes e renomadas instituições científicas que indicam que o fracking causa uma série de impactos socioambientais, como a mudança nas paisagens e a contaminação do solo, da água e do ar. A ANP não tem o direito de decidir sobre nosso futuro, colocando em risco nossa saúde e nossa economia. Eles nao sao transparentes e não dialogam com a população, priorizar o lucro de empresas em detrimento de do bem-estar da sociedade brasileira”, concluiu Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da 350.org Brasil e América Latina e coordenadora nacional da COESUS.

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Pontal do Paranapanema (CBH-PP) promoveu nesta quarta-feira (4), em Presidente Prudente, o Seminário “Cuidando das Águas do Pontal do Paranapanema”. O tema desta edição foi o uso do gás de xisto, em razão das grandes interfaces entre produção de energia e água, com o Pontal do Paranapanema progressivamente sendo transformado em uma região de produção de energia.

O evento contou com a presença de José Lira e Nicole Oliveira. Entre os palestrantes estavam o procurador da República Luís Roberto Gomes e os professores Galileu Marinho das Chagas e Ricardo Hirata. O evento contou com o apoio da Prefeitura de Presidente Prudente, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), do Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE), do Instituto Geológico, do Ministério Público Federal e do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas da Universidade de São Paulo (USP).