8 agosto, 2021

Cinco sugestões para a cobertura do relatório do IPCC

Nesta segunda-feira, cientistas divulgarão um documento histórico sobre a crise climática global. Compartilhamos aqui ideias para aprofundar a cobertura desse levantamento.

O grupo de pesquisadores que fornece avaliações científicas periódicas sobre as mudanças climáticas aos tomadores de decisão, o IPCC, divulgará nesta segunda-feira (09) um relatório histórico sobre a crise do clima.

Espera-se que o documento aponte uma piora das condições de vida no planeta ainda mais rápida do que se previa, como resultado da elevação da temperatura na Terra, e que os especialistas enfatizem de forma inédita a urgência de evitarmos os “pontos de virada” do clima, eventos provocados pelo aquecimento global e que podem jogar a humanidade em uma espiral de catástrofes.

Um desses pontos de virada é a transformação da Amazônia em uma área com características mais próximas às do Cerrado. Cientistas preveem que a partir de um certo ponto de aumento na temperatura global e nos níveis de desmatamento, a maior floresta tropical do mundo pode se converter em uma savana. Isso levaria a perdas inestimáveis para a biodiversidade e a transformações significativas no padrão de chuvas em boa parte da América do Sul, o que elevaria o risco de outros problemas graves, como falta d’água nas áreas onde vive a maioria da população brasileira e quebra na produção de alimentos.

Além disso, o documento do IPCC deve lembrar aos tomadores de decisão que está cada vez mais difícil limitarmos o aquecimento global a 1,5° C, horizonte mais otimista do Acordo de Paris, o que reforça a necessidade de cortes ainda mais drásticos nas emissões de gases do efeito estufa.

Nesse sentido, os cientistas têm deixado bastante claro que a principal solução para evitarmos os cenários mais catastróficos é que os países tomem medidas urgentes e ambiciosas para deixar de lado a extração e o uso de petróleo, gás e carvão, combustíveis que podem ser substituídos por formas renováveis e socialmente justas de geração de energia.

“Esse relatório funciona como uma caneta marca texto sobre as mensagens que os cientistas, os povos indígenas e os ambientalistas vêm expressando há muito tempo: cada dia de atraso na transição energética representa mais vidas destruídas”, afirma Ilan Zugman, diretor da 350.org na América Latina.

Zugman aponta também que o estudo do IPCC traz um alerta crucial para o Brasil.

“A ciência está comprovando mais uma vez que insistir em políticas de desmatamento da Amazônia, leilões de petróleo e expansão das termelétricas a gás e carvão representa um passo rumo ao suicídio. Nós, brasileiros, já estamos sofrendo os impactos da crise climática, mas a situação será muito pior se não mudarmos de rota. Sabemos o que é preciso fazer e precisamos agir sem demora”, ele diz.

Cinco sugestões para a cobertura do relatório do IPCC

1. Deixar claro que o relatório reforça o que os cientistas já diziam

O relatório deve trazer novidades significativas, como o destaque para a dificuldade de limitarmos o aumento da temperatura média do planeta a 1,5°C e o risco de alcançarmos os “pontos de virada” antes do previsto. Porém, isso não significa fim de jogo para a luta pela limitação do aquecimento. Pelo contrário, essas informações tornam ainda mais urgentes os cortes nas emissões. Enfatizar essa confirmação é importante para evitar a falsa impressão de que não podemos fazer mais nada para evitar catástrofes climáticas.

2. Contextualizar as causas da crise climática

Os cientistas não têm mais dúvidas de que a principal causa do aquecimento global é o acúmulo de gases do efeito estufa na atmosfera, provocado principalmente pela queima de combustíveis fósseis e pelo desmatamento. É muito importante explicitar como chegamos até aqui, para que o público entenda o que está acontecendo. Organizações que apontam claramente a responsabilidade do setor de combustíveis fósseis, como a 350.org, estão disponíveis para falar sobre esse tema.

3. Mencionar os impactos do aquecimento global em toda sua extensão

A provável menção no relatório do IPCC sobre a iminência da savanização da Amazônia como um “ponto de virada” trágico para a humanidade traz a necessidade de nós, brasileiros, entendermos o que está em jogo. Não se trata de uma ameaça distante aos ursos polares, mas de um impacto violento sobre a vida da maioria da população do país. Os danos gerados por esse fenômeno, caso a mudança venha a ocorrer, podem se estender para a agricultura, a alimentação das famílias, a inflação, a segurança hídrica nas grandes cidades, entre vários outros pontos. Ouvir os cientistas brasileiros sobre o que esse e outros “pontos de virada” podem representar para o dia a dia da população seria um acréscimo significativo à qualidade da cobertura sobre o relatório.

4. Ouvir as pessoas mais diretamente afetadas

O relatório do IPCC é um produto científico, mas é possível humanizar as conclusões do estudo ouvindo comunidades que já sofrem impactos da emergência climática. Uma boa forma de fazer isso é procurar organizações indígenas, associações de pescadores ou de pequenos agricultores e ONGs representativas de áreas vulneráveis nas cidades, como as associações de moradores de comunidades. Vale lembrar, na cobertura do relatório, que o impacto das mudanças climáticas assume recortes diferentes de acordo com aspectos de gênero, raça e classe social.

5. Discutir as soluções

As soluções para a crise climática existem e são conhecidas. Universidades, organizações indígenas, grupos de jovens ativistas e ONGs têm promovido seminários online, estudos e debates intensos sobre os caminhos para mitigar a crise climática no Brasil e gerar adaptação, com propostas bem concretas. Procurar representantes desses grupos e direcionar a conversa para as soluções, e não só para os problemas, é um caminho relativamente pouco explorado pela imprensa. Algumas das propostas mais concretas de políticas públicas de transição energética exequíveis imediatamente incluem: a) o fim dos leilões de petróleo e gás da ANP; b) o redirecionamento do crédito que bancos públicos como o BNDES oferecem a combustíveis fósseis (foram mais de R$ 90 bilhões em dez anos) para as energias renováveis; c) apoio à descentralização da geração de energia, com estímulo a pequenas estruturas de energia solar e eólica nas cidades e em áreas rurais.

Contato para a imprensa

Peri Dias
Comunicação da 350.org na América Latina
[email protected] / +591 7899 2202