17 setembro, 2022

Evento alerta para os riscos da exploração de gás no Maranhão

Comunidades tradicionais, pesquisadores e ativistas climáticos reúnem-se para debater possibilidades de resistência à chegada do fracking

Participantes do IV Encontro Maranhense de Agroecologia reunidos neste sábado para discutir as ameaças do fracking aos territórios tradicionais do MA. Crédito da foto: Renan Pereira / 350.org

Diante da ameaça de que o Maranhão se torne o primeiro estado do país a receber projetos de fracking, técnica de extração não-convencional de gás que provoca danos ao meio ambiente e à saúde pública, ativistas e representantes de comunidades maranhenses reuniram-se neste sábado (17), na Região Metropolitana de São Luis, para debater estratégias de proteção dos territórios tradicionais e de resistência às investidas do setor de combustíveis fósseis.

O debate ocorreu em uma oficina facilitada pela ONG global de campanhas pelo clima 350.org, como parte do IV Encontro Maranhense de Agroecologia. Organizado pela Rede de Agroecologia do Maranhão (RAMA), o encontro conectou centenas de representantes comunitários, pesquisadores e cientistas, de 15 a 17 de setembro, para articular respostas aos desafios mais urgentes enfrentados pelas populações tradicionais do estado.

“A conversa sobre os riscos do fracking entrou na programação do encontro como um reconhecimento de que a ameaça ao Maranhão é iminente e exige respostas à altura do perigo que essa técnica representa”, afirma Renan Pereira, organizador de campanhas da 350.org.

No debate, após uma explicação detalhada sobre o funcionamento do fracking e suas consequências para o meio ambiente, o clima global e as populações de áreas próximas ao local de extração, os participantes puderam compartilhar suas preocupações e discutir ideias para evitar que a atividade se instale na região.

“O pessoal das empresas de gás vê o fracking como uma solução, só que essa “solução” já está proibida em vários países, porque, entre outras coisas, pode prejudicar a saúde da população. Vemos essa técnica como uma pancada muito forte para as nossas comunidades e o planeta”, afirma  Paulo Lucena, da Casa Familiar Rural de Imperatriz.

Fracking gera perdas econômicas e acaba com a paz das comunidades

O fracking (ou fraturamento hidráulico) consiste em criar fraturas nas rochas de camadas profundas do solo para extrair o gás e o petróleo que se encontram depositados nesses locais. Para criar essas fraturas, empresas de combustíveis fósseis perfuram o terreno, inserem tubos que chegam a mais de 3 quilômetros de profundidade e injetam, a alta pressão, uma mistura de água, areia e produtos químicos, alguns deles altamente tóxicos. 

Diversos estudos científicos, publicados em revistas internacionais e realizados por universidades dos Estados Unidos e do Canadá, associam o fraturamento hidráulico à contaminação de fontes de água, a terremotos e a danos à saúde pública, incluindo um aumento nos problemas de saúde de mães e bebês e na proporção de pessoas com câncer nas populações afetadas. 

Na Argentina, onde algumas das empresas de combustíveis fósseis mais conhecidas do mundo usam o fracking para extrair gás da reserva de Vaca Muerta, as comunidades vizinhas tiveram perdas econômicas graves na agricultura, já que o risco de contaminação das fontes de água reduz a aceitação e o preço dos cultivos locais. Milhares de famílias sofrem com as rachaduras em suas casas e o pânico dos tremores de terra, que passaram a acontecer com mais frequência e intensidade, inclusive durante a madrugada. 

Lideranças comunitárias de áreas próximas a Vaca Muerta também relatam ameaças e intimidações a quem se opõe ao fracking, redução da biodiversidade por causa do barulho e da poeira causados pelas operações e negligência no tratamento de rejeitos contaminantes.

Além disso, os ganhos com o fraturamento hidráulico sequer são compartilhados com a população local. A província de Neuquén, onde se localizam as principais operações de exploração na Argentina, é uma das mais endividadas do país e registra graves problemas sociais. O próprio funcionamento do complexo de exploração de petróleo e gás em Vaca Muerta só é possível porque o governo argentino queima bilhões de dólares em subsídios a esses setores, em um país com dificuldades para pagar sua dívida externa e fazer investimentos básicos.  

O fracking ainda agrava a emergência climática global, ao permitir a extração de volumes maiores de petróleo e gás e, assim, ampliar a queima de combustíveis fósseis, principal causa da crise do clima. 

Por seu potencial destrutivo, o fracking já foi banido na França, no Reino Unido, na Espanha e em outros países. No Brasil, Paraná e Santa Catarina também já aprovaram leis estaduais proibindo o fracking. 

Maranhão na mira do governo federal

Apesar das evidências do impacto nocivo do fraturamento hidráulico, o próprio governo federal está estimulando as empresas a levarem para o Maranhão essa técnica, que ainda não é usada no Brasil pela falta de regulamentação por parte dos órgãos ambientais.

O caminho para driblar essa restrição e permitir a entrada do fracking no estado é o Projeto Poço Transparente, programa piloto conduzido pelo Ministério de Minas e Energia (MME), em conjunto com  a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). 

Em cartilhas e entrevistas à imprensa, essas organizações estão convidando as empresas a participar das primeiras experiências brasileiras em “exploração não-convencional”, um eufemismo para o fracking, por meio de perfurações na região da Bacia do Parnaíba.

A empresa de energia Eneva, que explora gás fóssil em plena floresta amazônica e sem a devida consulta às comunidades Mura do Amazonas impactadas pela sua operação, já anunciou interesse em criar três poços na Bacia do Parnaíba ainda em 2022.

“O governo federal está entregando uma área importantíssima do Maranhão de bandeja para as empresas de gás, sem ouvir as comunidades que vivem na região e nem os cientistas que pesquisam o tema e afirmam que o fracking é perigoso”, afirma Renan Pereira.

“É como se a vida nessa região valesse menos do que em outras partes do Brasil, o que caracteriza o racismo climático embutido no Projeto Poço Transparente”, completa.

 

Informações para a imprensa

Peri Dias
Comunicação da 350.org na América Latina
[email protected] / +351 913 201 040